Os 15 anos da lei Maria da Penha na perspectiva do cordel: a OCHE Ceará como ferramenta de produção textual

Eis que veio a lume o segundo E-Book da Olimpíada de Ciências Humanas do Ceará (OCHE), realizada pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE).sendo a culminância da terceira edição da nossa Olimpíada que ocorreu de forma online em 2021. Extremamente relevante, eivada de humanismo e compromisso social, sobremaneira em defesa da mulher, sua temática é acerca dos quinze anos da existência da Lei Maria da Penha, que visa assegurar existências femininas, findando com agressões de todas as formas, a citar algumas, como a física, a psicológica, a sexual e a patrimonial.

Assim, essa obra é de fundamental importância, especialmente em virtude do contexto histórico no qual o Brasil está inserido, principalmente em virtude da formação histórico-político-ideológica, marcada pelo machismo, patrimonialismo, patriarcalismo produto do período colonial brasileiro e que se estende até os dias de hoje. A formação social brasileira conservadora coloca como centralidade da formação social, econômica, política e territorial do Brasil tendo sendo marcado por elementos próprios do capitalismo brasileiro, conforme nos aponta José Chasin (1999) Antonio Carlos Mazzeo (1989), que identifica um capitalismo tardio de via colonial, onde os elementos supracitados estão intrínsecos como formas de acumulação do capitalismo brasileiro. 

Nesta coletânea há a compilação de 134 cordéis escolhidos na quarta e última fase da supracitada edição da OCHE. São conjuntos de versos em dicções predominantemente juvenis - de estudantes das redes municipal, estadual, federal e privada, desde o oitavo ano do Ensino Fundamental II, Ensino Médio e EJA - e engajadas no combate ao feminicídio e à misoginia, revelando o quão as mulheres, de todas as cores, dores e situações financeiras, devem ter os direitos respeitados e suas vidas salvaguardadas.

Desejamos que profusas reflexões e lutas por transformações sociais possam ser suscitadas a partir das leituras da literatura de cordel aqui reunida, tendo a capacidade de tocar mentes e corações para uma sociedade livre do machismo e de quaisquer tipos de sevícias às mulheres, basilares nos lares, nos laboratórios, nas empresas, nacionais e multinacionais, nas salas de aula, nos tatames, nos fóruns... e em toda parte que desejarem ocupar e contribuir.

Em uma perspectiva formativa, o desenvolvimento de cordéis relacionados à temática  que circunscreve a Lei Maria da Penha, a violência doméstica e de gênero, tem como objetivo o desenvolvimento da criticidade utilizando o cordel como gênero discursivo, pautados na experiência afetiva na construção textual (MARTINS; WANDERLEY, 2020) e desdobrando o humor em “ele é uma espécie de arma de denúncia, de instrumento de manutenção de equilíbrio social e psicológico; uma forma de flagrar e revelar outras possibilidades de visão do mundo.” (TRAVAGLIA, 1990 apud MARTINS; WANDERLEY, 2020, p. 252).

Desta forma, os trabalhos tomam novos desdobramentos para além da própria exigência da tarefa da OCHE 2021, tornando-os, assim, elementos histórico-reflexivos da percepção discente sobre o fenômeno abordado. Pedimos, portanto, que o leitor aprecie a originalidade, a criatividade, e mais que tudo, a construção crítica de jovens estudantes cearenses sobre a realidade que os cercam, trabalhando, inclusive, a autorreflexão sobre o machismo e patriarcalismo estrutural que ainda permeiam o Ceará e o Brasil como um todo.